O que é o amor?

O amor é um processo dinâmico cujo objetivo é garantir a continuidade da espécie e gerar bem estar e sensação de segurança sem os quais seria mais difícil suportar o estresse do dia a dia.

O amor não começa de um dia para o outro, há toda uma sequência de eventos que precisam acontecer para que duas pessoas cheguem a se amar. Assim como não se pode chegar à idade adulta sem passar antes pela infância e pela adolescência, para que o amor possa ocorrer o casal precisa passar, com sucesso, por diferentes fases, bem definidas e delimitadas: atração, paixão e apego.

A atração

A atração é a primeira fase do amor. Ocorre naquele momento em que uma pessoa em particular desperta um profundo interesse na gente. É difícil determinar porque nos sentimos atraídos por uma pessoa em especial e não por outra. Estima-se que “pesquemos” pequenos sinais na pessoa (como o tom de voz, o jeito de mexer no cabelo, a forma de mover o corpo, as ideias que defende, os traços do seu rosto), que, por alguma razão desconhecida, despertam em nós uma forte atração sexual. Uma hipótese é que algo na pessoa nos remeta a alguma vivência antiga e “adormecida” de bem-estar e segurança.

A atração não necessariamente vai desembocar na paixão.

A atração pode ser refreada, como, na maioria das vezes, realmente o é. Com muita frequência, nos sentimos sexualmente atraídos por outra pessoa, mas não passamos à fase seguinte de aproximação. Isso acontece porque, alguns segundos depois de nos sentirmos atraídos por uma pessoa, nosso cérebro começa a racionalizar: “mas não sei quem este homem é, ele é um desconhecido e pode ser perigoso”, “ela é namorada do meu amigo”, “ele é fumante”, “mas eu sou casado”. Nestas situações, refreamos a atração e ela morre aí, com o processo terminando.

Por outro lado, uma vez que a atração ocorreu, não foi refreada pela nossa vontade consciente e desembocou em uma relação sexual, duas coisas podem ocorrer.

Se esta atração era dirigida à satisfação imediata do desejo sexual, nenhuma relação se desenvolverá  e a atração desaparecerá logo após o orgasmo. Por isso os especialistas dizem que, para se apaixonar, é preciso estar predisposto.

Nós só nos apaixonamos quando estamos abertos e receptivos a esta possibilidade, quando estamos querendo criar algo novo, fugir da rotina, trazer emoção à nossa vida, criar coragem para deixar um relacionamento insatisfatório ou mesmo atenuar a tristeza de uma depressão. Portanto, se após a atração bem sucedida a pessoa estiver predisposta ao apaixonamento e se, além disso, ela idealiza, admira e vê naquele parceiro possibilidades a longo prazo, a paixão está pronta para começar.

A paixão

Há quem diga que a paixão é uma doença. Apesar de discordarmos desta opinião, é inegável que a paixão corresponde a um estado mental muito alterado, com o nosso cérebro sendo “bombardeado” por substancias químicas, a tal ponto de termos a sensação de que estamos “perdendo a cabeça”.

A paixão pode ser considerada uma verdadeira avalanche emocional, com uma tempestade de neurotransmissores (substâncias químicas que transmitem informações entre os neurônios) inundando nosso cérebro.

A pessoa apaixonada vive constantemente feliz, com uma persistente sensação de bem estar. Do ponto de vista biológico, o mérito desta sensação gostosa é da dopamina, principal neurotransmissor dos centros de prazer e recompensa cerebrais, responsável pela elevação do humor e pela busca de novidades.

O apaixonado costuma ter seus pensamentos invadidos por lembranças intrusivas da pessoa amada, e estes pensamentos são bastante parecidos com os pensamentos obsessivos de um paciente com transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Tais lembranças da pessoa amada podem chegar a atrapalhar a concentração e, com isso, os estudos ou o trabalho, daí quem diga que estar apaixonado equivale a estar “doente”.

O comportamento do apaixonado também muda, com uma forte tendência a priorizar comportamentos que tragam aproximação com o ser amado, acompanhados por maiores cuidados com a aparência física. Estes rituais de embelezamento, uso de perfumes, cremes, colônias são muito parecidos com os rituais animais e também modulados pela dopamina, e têm como objetivo estimular a atração sexual pelo parceiro.

Outros comportamentos, como sorrir frequentemente, falar em tom de voz mais “macio” ou infantilizado, tocar o outro com frequência e prestar atenção enquanto o outro fala são comportamentos típicos de casais apaixonados.

A paixão dura, no máximo, um ano e meio a dois anos.

Pode parecer triste, em uma primeira olhada, que a paixão tenha data definida para acabar. Afinal, é tão gostoso viver apaixonado, “nas nuvens”, achando tudo maravilhoso…Entretanto, este estado mental alterado não poderia se manter para sempre, sob pena de inviabilizar todo o restante da vida (trabalho, amizades, lazer e a própria constituição da família).

Além disso, vamos lembrar que a intenção da natureza, com todo esse processo, é a perpetuação da espécie e dois anos é o tempo médio necessário para um casal procriar, a mulher gestar e ter início uma nova família, com o bebê saindo da fase mais complexa das primeiras semanas de vida. Como seria se esse casal continuasse perdidamente apaixonado, sem pensar em mais nada senão no outro e inundado por uma tempestade neuroquímica? Eles teriam menos tempo e energia para se dedicar aos cuidados que o bebê exige e às necessidades que a nova família terá. É necessário, portanto, que a tranquilidade se restabeleça.

Assim, se tudo corre bem e a relação progride, é natural que a paixão vá atenuando, que nossos pensamentos não sejam mais invadidos a todo momento pelas lembranças do outro e que nosso comportamento não fique mais tão exclusivamente orientado ao parceiro. O casal começa a se conhecer melhor e a se empenhar em levar uma vida recíproca, abrindo mão de algumas coisas, procurando consensos e sintonizando a vida um com o outro.

Desta forma, a ansiedade e a intensidade da paixão são substituídas pelo apego e pelo amor. É nesta fase que a relação se estabiliza. Mesmo fadada a terminar, a fase da paixão é importantíssima! É a lembrança da intensidade da paixão que vai manter os casais unidos nos momentos de crise e tédio futuros. Assim, casais que viveram uma paixão muito intensa têm algo mais em que “se agarrar” nos momentos em que a relação entra em crise do que aqueles que nunca foram muito apaixonados um pelo outro.

Mas nem toda a paixão evolui para o estágio seguinte, do amor. Muitas relações acabam com o fim da paixão, e, neste caso, o amor não chega a acontecer.

O amor

A chegada do amor em geral coincide com aquele momento no qual percebemos que a pessoa amada não é aquele ser maravilhoso e sem defeitos que imaginávamos. Ou seja, o fim da paixão traz o fim da idealização do outro e a capacidade de se enxergar o parceiro como ele realmente é, com suas qualidades e defeitos. Mas, se o amor se instalou, percebemos que, apesar de o outro ser imperfeito, que esteja meio gordo, careca, acorde sempre mal humorado ou use roupas fora de moda, ainda assim o amamos profundamente e queremos continuar nossa vida ao seu lado.

Do ponto de vista bioquímico, enquanto a dopamina, a serotonina e a noradrenalina estavam envolvidas na fase do apaixonamento, a oxitocina pode ser considerada a substancia química do amor.

A oxitocina é um neuropeptídeo produzido no cérebro (mais especificamente no hipotálamo) e liberado durante a amamentação, sendo de fundamental importância para a formação do vínculo mãe-filho. Mas a oxitocina também é liberada, em altas concentrações, durante o orgasmo feminino e masculino, sendo que, no homem, há ainda a liberação maciça de outro neuropeptídeo (a vasopressina). Assim, o ato sexual reforça o vínculo entre o casal através, principalmente, da oxitocina. É claro que esta liberação não basta, pois, quando não há sentimento afetivo pelo parceiro com quem se está tendo uma relação sexual, o córtex cerebral é capaz de inibir essa liberação. Em outras palavras, a vontade de se comprometer e se relacionar afetivamente com o outro precisam estar também presentes, para que, com o “empurrãozinho” da oxitocina liberada durante o sexo, o apego se forme entre o casal. E este apego só evolui para o amor se há uma vontade consciente por parte da pessoa em vencer os obstáculos e construir uma história com a outra.

O amor que os homens sentem é diferente do das mulheres?

O homem e a mulher se apaixonam com a mesma facilidade e intensidade. Durante a fase de atração, no entanto, há importantes diferenças entre os gêneros.

Os homens têm um limiar mais baixo para a excitação sexual e se sentem atraídos principalmente por estímulos visuais. Buscam especialmente sinais de feminilidade, saúde e beleza. Já as mulheres são menos visuais e não se atraem tanto pelo aspecto físico, mas por atributos sugestivos de força, saúde e poder.

Embora a paixão seja igual em ambos os sexos, a forma de expressá-la difere: os homens costumam controlar melhor suas emoções e demonstrá-las menos; as mulheres gostam de falar e analisar detalhadamente o que sentem.

Aparentemente, a mulher coloca a vida afetiva em um grau de importância maior do que o homem, estando mais propensa a abdicar da vida profissional se necessário.

Homens e mulheres amam com a mesma intensidade, entretanto, os homens têm uma forma de apego mais dependente da parceira em comparação com as mulheres. Ao término da relação, o homem que ainda ama a mulher tende a adotar comportamentos mais agressivos, a abusar de álcool ou drogas e a reclamar de forma mais raivosa e violenta. A mulher na mesma situação tende a controlar melhor as emoções, podendo exibir um humor mais depressivo, porém menos chamativo.

E o amor “doente”?

Infelizmente, o amor nem sempre é “saudável”, ou melhor, há pessoas que amam de uma forma patológica.   Alguns exemplos são pessoas que não conseguem se apaixonar, outras que têm muito medo da paixão e, por isso, quando começam a se apaixonar preferem terminar a relação.

Há pessoas que, ao contrário, se apaixonam rapidamente mas não conseguem dar o passo seguinte: precisam viver apaixonadas, trocando de parceiro toda vez que a paixão “esfria”. Estes costumam ter muitos relacionamentos pouco duradouros.

Há ainda pessoas que se apegam imediatamente a outras, “forçando” uma intimidade que ainda não foi construída. É o caso de pessoas que dizem que amam a outra logo no início do relacionamento; estes indivíduos parecem gostar mais de estarem se relacionando do que do parceiro em si. Muitas vezes, os indivíduos assim sofrem porque o outro parece estar sempre “fugindo” da intimidade, pois se sente invadido.

Existem pessoas que amam de uma forma incondicional, mesmo que tenham que se prejudicar para permanecer ao lado do parceiro. Muitas mulheres com esta condição reconhecem a si mesmas como “mulheres que amam demais” e sofrem porque sacrificam inúmeras áreas da sua vida e até sua auto-estima apenas para manter a relação.

Há pessoas que, quando amam, querem que o outro viva exclusivamente para a relação e podem ser extremamente possessivas e ciumentas. Estas pessoas podem chegar a ser violentas se suspeitam ou descobrem que o outro está cultivando outros interesses fora da relação, mesmo que não esteja sendo infiel.

Todas estas formas disfuncionais de viver o amor trazem sofrimento a ambos os parceiros e podem ser trabalhadas com um profissional adequado.

Obs. 1 Este texto tem finalidade meramente informativa e não substitui a necessidade de uma consulta médica.
Obs. 2 Para mais detalhes sobre o texto acima, sugerimos a leitura do livro “A natureza do amor”, da psiquiatra italiana Donatella Marazziti, do qual algumas informações foram extraídas.